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Leonardo Sakamoto

MPF divulga frigoríficos que podem ser processados por desmatamento ilegal

Leonardo Sakamoto

10/02/2010 08h24

O Ministério Público Federal no Pará enviou recomendação a 36 empresas para que deixem de comprar gado de propriedades rurais que não esteja inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Se desrespeitarem a solicitação, poderão ser processadas judicialmente por desmatamento ilegal. Os documentos foram enviados na última sexta (5) e, a partir do seu recebimento, elas têm 48 horas para responder.

Esta é mais uma etapa das ações que o MPF vem movendo contra a indústria de carne no Pará inserida na cadeia produtiva de crimes ambientais ou trabalhistas. Em julho do ano passado, frigoríficos acusados de colaborar para o desmatamento da Amazônia e o governo do Pará assinaram, após um mês de negociações, termos de ajustamento de conduta com o Ministério Público Federal. Em 2009, tiveram que aderir ao acordo as empresas Bertin (hoje sob administração do JBS-Friboi), Minerva, Agroexport, Ativo Alimentos, Boi Branco, Coopermeat, Durlicouros, Couro do Norte, Frigorífico Industrial Eldorado, Frigorífico Rio Maria, Kaiapós Fabril e Exportadora, Redenção Frigorífico do Pará e Xinguara Indústria e Comércio.

Os acordos com os frigoríficos prevêem que estes passam a exigir dos fornecedores a moratória total do desmatamento, o reflorestamento de áreas degradadas e o licenciamento ambiental. Também irão informar a origem da carne aos consumidores e ao MPF-PA, que vai verificar a existência de trabalho escravo, crimes ambientais e grilagem entre os fornecedores. No termo de compromisso entre o governo e o Ministério Público Federal há medidas como a implantação de cadastro informatizado de propriedades rurais e da Guia de Trânsito Animal Eletrônica no prazo de um ano.

De acordo com Daniel César Avelino, procurador da República responsável pelas ações contra as empresas na cadeia produtiva do desmatamento, os empresários devem estar conscientes de que o cumprimento do acordo será fiscalizado rigorosamente. Uma auditoria independente, junto com uma comissão formada por dez procuradores da República, vai fiscalizar anualmente o cumprimento dos acordos, com monitoramento por satélite e vistorias nas propriedades. O governo estadual dará apoio financeiro para a contratação dessa auditoria.

O objetivo dessa nova recomendação enviada foi impedir frigoríficos e outras empresas que continuam comprando de quem desmata ilegalmente a Amazônia possam se beneficiar economicamente sobre quem já se comprometeu com os termos de ajustamento de conduta. Em outras palavras, evitar a concorrência desleal.

Isso, é claro, é apenas um primeiro passo no sentido de garantir que os produtos consumidos pelos brasileiros estejam livres de crimes sociais e ambientais em seu DNA. Entre os desafios pela frente, está a necessidade do governo federal implantar um sistema gratuito e transparente de rastreabilidade de produtos agropecuários para que o controle social contra desmatadores torne-se parte do cotidiano dos cidadãos.

Relembrar é viver
Com base em um rastreamento de cadeias produtivas realizado em parceria com o Ibama, o Ministério Público Federal do Pará iniciou duas dezenas de processos judiciais contra fazendas e frigoríficos, pedindo o pagamento de R$ 2,1 bilhões em indenizações pelos danos ambientais no final de maio. Dezenas de empresas que compraram subprodutos desses frigoríficos receberam notificações em que foram informadas que haviam adquirido insumos obtidos através do desmatamento ilegal da Amazônia. A partir da notificação, deveriam parar de comprar desses fazendeiros e frigoríficos ou passariam à condição de co-responsáveis pelos danos ambientais.

Entre as empresas notificadas estavam varejistas como Carrefour, Wal-Mart, Bompreço (que pertence ao Wal-Mart) e Pão de Açúcar. Entre os frigoríficos processados aparecia um dos maiores do país, o Bertin, que comprou gado de fazendas com crimes ambientais. Entre as fazendas irregulares, nove pertencem a Agropecuária Santa Bárbara, ligada ao banqueiro Daniel Dantas.

Apesar da chiadeira de produtores rurais e das bravatas de seus parlamentares ruralistas, o varejo respondeu à ação. Por exemplo, redes de supermercados, como Wal-Mart, Carrefour e Pão de Açúcar, acataram as recomendações, pressionando ainda mais os frigoríficos. Estima-se que o Bertin tenha amargado perdas de R$ 50 milhões no período.

As empresas que receberam a notificação nesta semana são:
Atlas Frigorífico, B Comércio de Carnes e Frios Ltda, Boi Bom Ltda, Comercial de Carnes Barão Ltda, D'Amazônia Indústria e Comércio Ltda, Frigol Pará Ltda, Frigopar Frigorífico e Indústria Ltda, Frigor Atlas Ltda, Frigorífico 3 Irmãos Ltda, Frigorífico Altamira Ltda, Frigorífico Campos Ltda ME, Frigorífico Eldorado, Frigorífico Extremo Norte Indústria Ltda, Frigorífico Fama Ltda, Frigorífico Industrial Altamira Ltda, Frigorífico Pollux Ltda ME, Frigorífico Serra Norte Ltda, Frigorífico Sabará Ltda, Frigorífico Simental, Frigorífico Três Marias Ltda, Frigoxin Comercial Ltda, Frimaster Comércio de Alimentos Ltda, JC Araújo Comércio de Alimentos Ltda, Mafrinorte Matadouro e Frigorífico do Norte Ltda, Matadouro Frigorífico do Baixo Tocantins Ltda, Matadouro e Marchantaria Pollares Ltda, MFI Assessoria e Desenvolvimento de Negócios Empresariais Ltda, MJ Novaes de Lima & Cia Ltda, MR Souza Júnior ME, Novo Norte Alimentos Ltda, Redenção Frigorífico do Pará Ltda, Riocarnes Comércio de Alimentos Ltda, Rosiel Sabá Costa, Soberano Alimentos Ltda, Solanio Rodrigues Monteiro ME, Xinguara Comércio de Carnes Ltda

Para baixar um resumo do acordo do MPF com os frigoríficos, clique aqui.

Para baixar um resumo do acordo do MPF com o governo do Pará, clique aqui.

Para baixar a lista das empresas notificadas em 2009 que compraram produtos dos frigoríficos, clique aqui.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.